quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Os Livros de 2021

Fim de ano. Momento de balançar. Não sou de fazer resoluções de Ano Novo, mas no que me propus a ler mais em 2021, alcancei êxito razoável - abaixo a lista das obras contempladas no ano que se encerrará em poucos dias, e brevíssimos comentários ao que encontrei e inferi acerca das mesmas;

1 - Mussum Forévis - autor Juliano Barreto. Biografia linear da figura mais deslocada da trupe de comediantes Os Trapalhões, que fez enorme sucesso nas décadas de 1970 e 1980. Mussum, de favelado pobre a músico, e mais tarde a ícone da comédia brasileira, foi redescoberto pelas novas gerações que não tiveram dúvida em alçá-lo a um patamar cult que jamais desfrutou em vida. Um bom livro.

2 - O Homem Invisível - autor H. G. Wells. A hoje clássica história do jovem gênio sem escrúpulos que descobre um meio de tornar-se invisível, e tem na sua nova condição uma maldição a qual tenta se livrar sem, antes, abrir mão de buscar alguma vantagem nisto. Uma obra que certamente causou espanto à época, hoje padece de certo anacronismo; mas vale a leitura para conhecer um livro insigne.

3 - A Máquina do Tempo - autor H. G. Wells. Outro gênio, este repleto de amigos socialmente notáveis, inventa uma máquina do tempo e se aventura no futuro longínquo da humanidade, encontrando duas espécies de seres humanoides que, se supõe, teriam evoluído respectivamente de ambos os extremos da sociedade do período vitoriano - os miseráveis operários destinados a laborar incansavelmente nas fábricas da revolução industrial, e os privilegiados que consumiam os produtos ali criados. É uma crítica sutil ao que existia na Inglaterra de antanho. Admirável que hajam adaptado, e mais de uma vez, para o cinema.

4 - Nós - autor Ievgueni Zamiatin. 1984 de Orwell é, com certa frequência, apontado como plágio desta obra que descreve um futuro distópico, onde um estado onipresente doutrina seus cidadãos, numa alusão clara ao regime comunista soviético do período. A obra tem por base os diários de um cientista que narra suas impressões daquela sociedade considerada perfeita, até ver-se oprimido envolvido com grupos opositores ao regime. O final é desconcertante, melancólico e pessimista.

5 - Leonardo Da Vinci - autor Walter Isaacson. Um monumento em forma de livro, o autor submerge na Itália do Renascimento para trazer a tona a figura enigmática de um dos maiores gênios da humanidade. O Leonardo Da Vinci resultante torna-se mais humano sem deixar de ser extraordinário. Difícil afirmar que se trata de uma biografia definitiva, mas por certo está muito mais próxima de compor uma imagem reconhecível e familiar de uma pessoa até então considerada como paradigma inalcançável do que a espécie humana é capaz de produzir em seus momentos mais inspirados.

6 - O Sinal - autor Thomas de Wesselow. Um bom livro sobre o Santo Sudário de Turim, uma peça de linho que teria em si impressa a figura do cadáver de Jesus de Nazaré. O problema da obra começa quando o autor busca ligar a peça aos eventos narrados nos Evangelhos, tomando por metáfora o que pode não ser e vice-versa. A teoria que ele esboça e frouxa e materialista. Uma obra dispensável.

7 - Vinte Mil Léguas Submarinas - autor Júlio Verne. O capitão Nemo é, no mínimo uma personagem intrigante e, no máximo, um déspota apátrida, ou antes um gênio que tomou os oceanos da Terra como sua nação. A obra é um achado, senão um catálogo biológico de tudo quanto se conhecia da fauna e flora marinha no século XIX. Resulta numa leitura arrastada que busca insuflar no leitor as imagens mais deslumbrantes do que se esconde sob as águas do mundo, sem lograr êxito se este não for um grande conhecedor da cousa. No mais é um clássico superestimado.

8 - Viagem ao Centro da Terra - autor Júlio Verne. E lá vai o leitor se aventurar pela claustrofobia nos primórdios da espeleologia, conduzido por personagens meio cômicos criados pelo autor francês. O que a fantasia deste produz são instigantes imagens do que haveria no interior do globo terrestre, a tanto que deixa no leitor um sabor agridoce com tantas questões que vão surgindo, sem que a obra chegue a seu final com respostas satisfatórias. Longe de frustrar, contudo, é uma aventura juvenil bastante eficaz.

9 - A Volta ao Mundo em Oitenta Dias - autor Júlio Verne. Phileas Fogg é o dândi inglês que se vê desafiado por seus companheiros de clube a dar a volta ao mundo em 80 dias. A aposta é aceita, e lá se vai ele com seu criado francês Jean Passepartout atravessar o globo, ganhar a aposta, casar-se e ainda escapar a falsa acusação de um detetive equivocado. De longe o melhor livro de Verne dentre os três que escolhi para ler neste ano. Final emocionante.

10 - A Vida Secreta das Plantas - autor Peter Tompkins e Christopher Bird. Um verdadeiro compêndio de experimentos levados a efeito com a vida vegetal, por um sem número de pesquisadores, cientistas e entusiastas desde há algumas décadas passadas, buscando sustentar que aquela suculenta inocente que vive no vasinho junto a janela é mais do que aparenta. São passagens interessantíssimas de indivíduos e seus estudos que buscam se provar como a vida vegetal é uma vida muito diferente do que tem pensado a humanidade desde sempre. Leitura que exige certo esforço, mas instigante.

11 - O Pequeno Laboratório de Deus - autor Herminio C. Miranda. A biografia pouco profunda a pouco inspirada de George Washington Carver, considerado o 'Leonardo Da Vinci negro'. Botânico, agrônomo e inventor, George foi destaque em seu tempo, até mesmo entre a cultura racista branca dos Estados Unidos de então. O grande problema desta biografia está nos comentários desnecessários do autor acerca da causalidade da Providência Divina agindo junto a um gênio como Carver, tornando a biografia quase uma hagiografia. Tais especulações quanto a sua destinação, ou missão, não passam disto mesmo, apenas especulação, que em nada acrescenta ao livro, muito pelo contrário, resulta em concluir que tais passagens tomam um espaço que seria melhor ocupado com mais informações acerca do biografado.

12 - Vampirismo - autor José Herculano Pires. E pensar que tão incensado autor fora tão mais feliz em outras obras... aqui surge como um atirador senil que mira sua prolixa metralhadora literária a criticar a tudo e a todos, a tal ponto que, chegando ao final da obra, o leitor tem extrema dificuldade em saber do que trata esta. É uma decepção. Fica com ele o troféu do pior livro lido no ano.

13 - Resumo da Lei dos Fenômenos Espíritas - autor Allan Kardec. Livreto doutrinário do Espiritismo composto por seu codificador. Que mais se poderia querer senão o didatismo de um professor no pleno domínio da matéria? Eis Allan Kardec em sua melhor forma, usando de toda sua capacidade de síntese para resumir o Espiritismo a ponto que até mesmo um chimpanzé entenderia. Ótima pedida.

14 - O Espiritismo em Sua Expressão Mais Simples - autor Allan Kardec. E o mestre francês não se abala em buscar a perfeição, recompondo o texto, trabalhando linha a linha na busca por tornar tão fácil quando possível para o entendimento do leitor médio o manancial doutrinário espírita. Outra grande leitura do ano.

15 - Histórias de Horror O Mito do Cthulhu - autor H. P. Lovecraft. A obra que me apresentou a prosa lovecrafitiana em releitura necessária. Escritor de pulp fictions na década de 1930, Lovecraft foi amigo de Robert E. Howard, ninguém menos que o criador de Conan o Bárbaro. Ambos são hoje autores cult, e suas obras tornaram-se pilares da cultura pop, cada qual atacando de um lado - Howard considerado o criador do gênero Espada e Feitiçaria, e Lovecraft criador do Terror Cósmico. Aqui, alguns contos são reunidos, trazendo o melhor do seu estilo, pleno na composição da atmosfera e na capacidade de instigar a imaginação do leitor até as raias do inimaginável.

16 - O Horror de Red Hook - autor H. P. Lovecraft. Livreto com poucos contos do autor, retomando a temática central dos grandes deuses ancestrais, oriundos do espaço profundo, que habitaram a Terra em épocas imemoriais. Muito bom.

17 - O Ladrão de Casaca - autor Maurice LeBlanc. Acaso a Inglaterra tem Sherlock Holmes, um detetive, a França tem Arsène Lupin, o ladrão de casaca, um bandido cavalheiresco, refinado, e o maior de todos os afanadores desde então. A obra reúne diversos contos narrando as intrincadas peripécias do ladrão em aventuras tão saborosas que é de lamentar quando o livro se encerra. Uma ótima obra, infelizmente com uma capa bem feinha.

18 - As Minas do Rei Salomão - autor Henry Rider Haggard. Aparentemente a única tradução da obra seminal de Allan Quartermain para o idioma português vem lá do século XIX pela pena de Eça de Queiroz; e ele não executou lá um grande trabalho. A presente edição busca corrigir os erros e desvios do autor, apresentando um livro praticamente inédito para o leitor brasileiro. A história é já um clássico, em que um explorador inglês vivendo na África é cooptado por dois cavalheiros em busca do irmão de um deles, que aventurou-se no coração selvagem do continente negro em busca das míticas minas donde o igualmente mítico rei bíblico Salomão tirou sua fortuna. Uma obra obrigatória.

19 - Sapiens Uma Breve História da Humanidade - autor Yuval Noah Harari. E o materialismo atual do mundo ganha sua melhor tradução nesta obra. O livro desdobra-se em obviedades acerca de História, Antropologia, Sociologia, Arqueologia, e outras tantas disciplinas humanas para traçar um panorama materialista da trajetória do homem sobre a Terra. É uma cartilha niilista até o limite da sanidade - ao ler o ponto final, qualquer ser pensante sente-se tentado a apanhar o telefone e ligar para o CVV. Pode explicar parte do sistema de coisas do mundo, mas deixa questões que, obviamente, a visão materialista do mundo é incapaz de explicar. Uma bobagem que tornou-se best-seller.