terça-feira, 9 de julho de 2019

Cinema em poucas linhas #2 (contém spoilers)

Prosseguindo com a lista do festival doméstico de cinema.

O Primeiro Homem (The First Man)
O drama familiar do astronauta Neil Armstrong tem como pano de fundo o projeto aeroespacial americano de chegar a Lua - ou seria o inverso? Ou a mesma cousa, afinal, a exploração espacial tem seus dramas, tão trágicos quanto a perda da filha do primeiro homem a pisar no satélite natural de nosso planeta. Armstrong é o sujeito durão, o típico americano que renega os próprios sentimentos, quase frio. A atuação de Ryan Gosling capta este aspecto perfeitamente, encarnando um homem quase desprovido de personalidade - frente ao carisma magnético de Buzz Aldrin, ele é quase um cogumelo. Isto é tão verdade que, Aldrin está muito mais inserido na cultura americana que seu companheiro - Buzz Lightyear deve seu nome ao astronauta, por exemplo. Armstrong não digere bem a morte da filha pequena, encontrando paz apenas quando pisa na Lua. O filme tem uma conformação quase documental por vezes; assisti-lo é agradável, mas a história talvez merecesse um tom épico que faria bem a narrativa.

A Pele Fria (Cold Skin)
Estranheza - é o que esse filme evoca. Em 1914, um oficial cartógrafo é designado a habitar uma ilha no Círculo Polar Ártico por um ano, substituindo seu antecessor na mesma função. O único outro habitante do local é um oficial faroleiro; o sujeito é arredio e parece padecer dos piores efeitos do isolamento prolongado. Na primeira noite do novato, sua casa é atacada por criaturas de feições anfíbias. Não lhe resta alternativa senão apelar ao auxílio do ermitão do farol, que a contragosto aceita o estranho, que em pouco tempo se dá conta que a situação é um cadinho mais complicada do que apenas lidar com sapos humanoides monstruosos. O faroleiro tem em seu poder uma fêmea destes seres, a quem trata com rispidez, embora mantenha relações sexuais com ela. Aos poucos o cartógrafo reconhece que aqueles seres são os habitantes originais da ilha, e ele e seu companheiro são os invasores. Mas, partir da ilha não será uma alternativa para o faroleiro. É um filme que causou-me estranheza por sua condução, tanto por sua narrativa. Mas acaba deixando uma lembrança viva na memória, talvez, por possuir um aspecto perturbador, em que o isolamento daqueles dois homens se refletem na psique do espectador, que antevê a morte de ambos.

Dumbo (Dumbo)
Saem os animais, entram os humanos. O ponto de vista da história é transferida nessa versão em live action da clássica animação Disney de 1941. E é este seu grande problema - a fim de apelar para uma visão realista, os animais perdem a fala e o protagonismo, entregando-a aos humanos que ganham personalidades rasas e, para certos personagens, cartunescas. A narrativa é a mesma acerca de um elefantinho que nasceu com orelhas enormes que o permitem voar, e as consequências disto. Mas, se antes a fábula fazia sentido numa animação que, por si só, é lúdica o suficiente para abranger a história, facilitando a suspensão da incredulidade do espectador, sua contraparte fílmica não é! O roteiro cria situações e faz que suas personagens tomem decisões ilógicas, infantis mesmo, o que não causa estranhamento no público infantil, mas soa canhestra e absurda para os adultos. É um filme de visual deslumbrante, roteiro capenga e atuações anódicas, com suas exceções, claro! Mais um pra lista de filmes de Tim Burton que não me dizem nada.

A Vida em Espera (Wakefield)
Brian Cranston encarna um canalha que, lá pelas tantas, depois de brigar com a esposa, resolve se isolar no sótão da garagem e lá viver incógnito, tornando-se uma espécie de mendigo doméstico, oculto aos olhos de todos, mas principalmente de sua família. É preciso uma auto-suficiência e uma canalhice ímpares para se tomar uma atitude destas - quando passa a observar o desespero da esposa com um indisfarçável prazer, pensei que fosse desistir, mas ele leva sua decisão às últimas consequências, passando algo em torno de um ano escondido. Claro, isto lhe serve para alcançar uma espécie de redenção íntima, em que reconhece que sua ranzinzice com as filhas e a estafa conjugal foram motivadas por suas próprias atitudes. Lá pelo final, diante da iminente perda em definitivo da esposa para um ex-namorado que retorna a vida dela, ele sai de seu isolamento e... nesse ponto minha esposa e eu ficamos apostando que atitude ele tomaria. Acabei ganhando, pois a coerência do canalha é pontual - ele ressurge sala de estar adentro como se nada tivesse acontecido. O que vem a partir daí fica por conta da especulação do espectador, pois o filme se encerra. É um belo estudo de personagem, um presente para Cranston exercitar seu talento inigualável. Pode-se até não gostar de história, mas não há como desviar o olhar de seu protagonista.

Homem-Aranha no Aranhaverso (Spider-Man: Into the Spider-verse)
Tudo junto e misturado - várias versões do Homem-Aranha se encontram nesta animação de feições não convencionais, que abocanhou um Oscar, entre vários outros prêmios. Esta ideia de universos paralelos sempre foi premissa mais explorada pelo universo DC nos quadrinhos, embora a Marvel também o tenha. Mas, quase sempre, quem lidava com os desdobramentos de realidade alternativas sempre foram os X-Men. O que, a certa altura, impedia o desavisado leitor que adquirisse uma edição dos mutantes de entender o que lia - era hermético graças a essa decisão burra dos editores de por futuros múltiplos e realidades alternativas no caminho de seus personagens, tornando tudo uma grande bagunça. Em grande parte, por conta disto, a animação não me atraiu, e a expectativa era nula ao assisti-la - e admito, tenho dificuldade em recordar do enredo. E sou fã do teioso. O que não tira as qualidades desta. Mas, pra mim, é esquecível.

Mentes Sombrias (The Darkest Minds)
Uma pandemia mata jovens e crianças, e os que sobrevivem ganham super-poderes; o governo acha por bem contê-los em espécie de campos de concentração. São classificados por um didático sistema de cores correspondente aos seus poderes. Os Laranjas e Vermelhos são mortos, por serem poderosos demais a incapazes de ser contidos. Mas, veja só que lá pelas tantas do filme, quando um grupo de Vermelhos surgem, tudo o que eles fazem é cuspir fogo - este é apenas um dos exemplos que me fez desanimar deste filme. Baseado em mais uma série de livros juvenis que fazem a cabeça da garotada, assim como Harry Potter fez a de algumas gerações anteriores, esse filme busca dar início a adaptação cinematográfica dos vários volumes da história. Suspeito que não terá uma continuação, mas é apenas minha visão da cousa toda. Genérico de Jogos Vorazes, Saga Crepúsculo, Série Divergente, Maze Runner, etc. Pra quem gosta, um prato cheio.

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